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A budista, escritora e líder espiritual Monja Coen, durante a aula para magistrados, servidores e estagiários do Judiciário mineiro: sabedoria e serenidade
Uma palestra inspiradora, que levou um sopro de sabedoria e serenidade a magistrados, servidores e estagiários do Judiciário mineiro e provocou profundas reflexões sobre as relações entre Justiça e compaixão, foi proferida na última quinta-feira (18/9) pela budista, escritora e líder espiritual Monja Coen. 
A ação educacional, transmitida por meio de uma live, foi realizada pela Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef) do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e reuniu um público recorde de participantes: cerca de 750 pessoas acompanharam a aula ao vivo, e mais de 1.700 se inscreveram para participar da atividade.
Ao proferir algumas palavras no início da atividade, o presidente do TJMG, desembargador Nelson Missias de Morais, destacou que a desembargadora Áurea Brasil, 2ª vice-presidente da Casa e superintendente da Ejef, havia dado uma nova dimensão à escola — uma dimensão humana e social.
“A Ejef é uma escola de formação de magistrados e de preparação de servidores, e sabemos qual é a verdadeira função do magistrado: promover a paz social, a pacificação. E certamente nenhum conhecimento supera a sensibilidade humana”, afirmou.
Dirigindo-se aos novos juízes que assistiam à live — a atividade integrou o curso de formação para a carreira da magistratura, que se encerra na próxima semana —, o chefe do Judiciário mineiro destacou ser necessário que eles entendam a angústia das pessoas que batem à porta da Justiça. “O aperfeiçoamento é fundamental, mas a compaixão é necessária na vida do juiz”, observou.
O presidente citou Fernando Pessoa: “A atitude intelectual digna de uma pessoa superior é a de uma calma e fria compaixão por tudo quanto não é ele próprio. Não que essa atitude tenha o mínimo cunho de justa e verdadeira; mas é tão invejável que é preciso tê-la”. E em seguida rogou a todos: “Vamos exercer nossa jurisdição com sensibilidade e compaixão”.

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“O aperfeiçoamento é fundamental, mas a compaixão é necessária na vida do juiz”, observou o presidente do TJMG, desembargador Nelson Missias
Compaixão: virtude singular
A desembargadora Áurea Brasil, na abertura da aula, destacou os sentimentos de alegria, honra e gratidão com o fato de a monja Coen ter aceitado o convite para participar da ação. E contou que, quando questionada pela monja sobre o tema da palestra, não teve dúvidas de que seria “Justiça e compaixão”.
“Esse tema cala fundo em meu coração, não só pela importância que tem para todos no âmbito pessoal, mas especialmente para nós, do Judiciário, pelo trabalho que nos é dado a desempenhar: o de sermos responsáveis, por ofício, por prestar a justiça”, observou.
Falou então sobre uma importante reflexão que paira sobre o exercício da magistratura: “Como prestar justiça sem compaixão, sem amor, sem olhar o próximo, sem a capacidade de nos colocarmos no lugar daqueles que se apresentam à nós em estado de sofrimento?”.
A magistrada contou que o desenvolvimento e o aprimoramento desse olhar é uma tônica que ela tem procurado seguir em sua vida, e foi também o que procurou reforçar para os que integram o Poder Judiciário, nos dois anos em que esteve à frente da Escola Judicial do Tribunal mineiro.
“Em uma sociedade que pretende ser ‘fraterna, pluralista e sem preconceitos’, como escrito em nossa Constituição, a prática do direito exige de todos nós, acima de tudo, uma formação humanística mais ampliada, a busca da lucidez e o amor, que é a essência de todos os seres vivos, e deve se revelar em nossas ações”, ressaltou.
A magistrada contou que também buscou inspiração para a escolha do tema na última aula proferida por um mestre que marcou a formação acadêmica e pessoal dela, o professor João Baptisté Villela, que se despediu da Faculdade de Direito da UFMG com a aula magna “Justiça e compaixão”.
Entre outros pontos, antes de passar a palavra à palestrante, disse: “A Justiça praticada sem amor, dosada na balança, por pesos e medidas sob a força intimidadora da espada, não nos conduz à verdadeira e necessária pacificação. É preciso que ela traga em seu âmago as demais virtudes”.
E exaltou a compaixão como uma virtude singular, “que, inclusive, antes de ser virtude, é um sentimento, ela é o próprio amor e leva à misericórdia, já que compadecer com o sofrimento do outro não é aprová-lo nem compartilhar suas razões. É, sim, recusar-se a considerar um sofrimento, qualquer que seja, como um fato indiferente; e um ser vivo, qualquer que seja, como coisa”.
Confira a íntegra do discurso da desembargadora Áurea Brasil.

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A 2ª vice-presidente do TJMG e superintendente da Ejef, desembargadora Áurea Brasil, disse que o tema Justiça e compaixão calava fundo em seu coração
Paz e harmonia
“Esperava estar aí com vocês presencialmente, mas o coronavírus veio modificar as nossas expectativas. Penso que isso seja muito interessante para a nossa reflexão de hoje. Temos ideias programadas de como será o mundo, de como será o amanhã. E de repente vem o inesperado, que altera todas as possibilidades e os acordos feitos anteriormente, e agora eles precisam ser refeitos e repensados”.
Dessa maneira, a monja Coen iniciou sua palestra, falando sobre o medo, a insegurança e as reviravoltas provocados pela pandemia de covid-19. Por outro lado, ressaltou que, neste momento, as pessoas dispõem da tecnologia, que as coloca em contato, apesar da distância. “E assim podemos nos ver, nos falar e nos entender.”
Entrando mais diretamente no tema da palestra, a líder espiritual explicou que, no budismo, a compaixão se sustenta sobre dois alicerces: na própria compaixão e também na sabedoria. “Vocês, que trabalham com a Justiça, sabem que o signo dela é a sabedoria”, observou.
A monja lembrou então de figuras como Salomão, que personificou a ideia das decisões calcadas na grande sabedoria, indicando que, quando surge um conflito, a Justiça emerge como a capacidade do julgador de ter a imparcialidade necessária para colocar os fatos na balança e fazer um julgamento justo.
“O justo é o adequado, é o correto para a situação. Não é exatamente o que está nos livros, não é seguir ao pé da letra o que está ali, mas ter coração e capacidade de sensibilidade para saber se adaptar a cada circunstância e ver a necessidade verdadeira”, ressaltou.
A palestrante explicou que o chamado “ser iluminado” é aquele que vê as coisas como são, sendo capaz de tomar as decisões adequadas. “Algumas pessoas não são capazes de ver a realidade como é, mas essa é a função do jurista”, disse, observando que a tarefa é difícil.
“Carregamos em nós conceitos e muitas vezes preconceitos ancestrais, que vieram da nossa formação, até mesmo familiar. Despir-se disso, para olhar quem está na nossa frente e ver na situação que está ali, a fim de dar a melhor solução, nem sempre é fácil. Isso exige pessoas bem treinadas e experimentadas, não apenas no código das leis, mas também em relacionamento humano”, destacou.
Diante de um caso, observou a monja, acontece de o juiz não ter as provas oficiais de que uma pessoa é culpada, embora ele seja capaz de ler isso naquele que está sendo julgado. “E aí entra a arte dos meios hábeis: que meios hábeis podemos usar para que a verdade se manifeste e a verdadeira Justiça se faça?”, questionou.
Total harmonia
Ressaltando que a função da Justiça é pacificar e produzir uma sociedade mais harmônica, a palestrante falou ainda da falta que a harmonia tem feito na sociedade. “Isso é algo que precisamos resgatar: a harmonia entre os três Poderes, entre o eu e o outro, entre o ser humano e a natureza, entre corpo, mente e espírito”, declarou.
Para a monja, a desarmonia ocorre porque as pessoas foram rompendo “vínculos impossíveis de romper”. “Somos a vida da Terra, não viemos de outro lugar. A Terra não é nossa casa comum, ela é nosso corpo. Não vivemos se não tivermos oxigênio, água pura ou se o solo estiver contaminado. Nossa vida está em interferência direta com tudo que existe”, avaliou.
Nesse sentido, ela destacou a necessidade de as pessoas estarem em harmonia umas com as outras e contou que a primeira Constituição japonesa dizia que o mais importante no país era criar harmonia. “Harmonizar significa acolher, compreender, não quero transformar o outro, mas reconhecê-lo no direito de se expressar.”
Seguindo esse raciocínio, a monja Coen voltou a falar sobre o novo coronavírus, lembrando que não sabemos o que cura a doença e como ela se manifesta em cada pessoa. Essa instabilidade causa angústia e ansiedade, mas este é também um momento, destacou, que reforça o quão cada um está conectado com os outros.
“A pandemia nos corta por dentro, nos fere. Não podemos mascarar isso, pois cada vida importa. Mas vivemos em interrelação: o ser humano não é o centro da criação. Somos apenas uma das espécies e precisamos das outras para nossa sobrevivência e também dos outros seres humanos. E aí surge a solidariedade”, disse.
Para a palestrante, a pandemia reforça a interdependência entre as pessoas. “Não nos curamos sozinhos: precisamos de atendentes, médicos, enfermeiros, hospitais, respiradores. Não nos damos conta da preciosidade que é poder respirar sem aparelhos”, destacou.
A monja Coen ressaltou então: “Não percebemos as coisas mais sagradas e simples da existência. Temos bênçãos para agradecer todos os todos os dias e reclamamos mais daquilo que está faltando. O trabalho que temos de fazer como seres humanos é começar a dar valor àquilo que temos”.
Entre outros pontos, ela lembrou o caso recente da morte de um homem negro, George Floyd, por um policial branco, nos Estados Unidos, para exemplificar que, “quando a espada não tem compaixão, ela só fere e não é justa”. E lembrou que no budismo a espada corta o que é falso, o que não é verdadeiro, mas ela traz a verdade na outra mão.
Falou ainda sobre a meditação como um despertar da consciência e sobre os benefícios que ela pode trazer para produzir clareza mental; a importância de estar presente no aqui e no agora; de ter esperança, mas ao mesmo tempo uma postura ativa; e da compaixão por quem comete um crime, entre vários outros pontos.
Após a palestra, a monja Coen respondeu a perguntas dos participantes, tendo como mediador o juiz Rafael Niepce.
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A abertura da live foi acompanhada por magistrados e membros da equipe da Ejef; a aula contou com uma intérprete de libras 
Presenças na abertura
Na abertura do evento, a 3ª vice-presidente do TJMG, desembargadora Mariangela Meyer, também fez questão de dar as boas-vindas à monja. “A atual crise global humana de sofrimento e injustiça pela qual estamos passando cresce a cada dia. Nosso trabalho no Judiciário tem sido exatamente o de tentar aliviar o sofrimento daqueles que nos procuram e corrigir as injustiças”, observou.
Mariangela Meyer ressaltou que, onde há Justiça, efetivamente a compaixão se encontra presente. “Estamos vendo que as pessoas estão cada vez mais egoístas. Penso em compaixão como justiça quase divina e eterna, que fará de tudo para combater esse egoísmo da humanidade, numa forma reparativa, dentro do que é possível”, afirmou.
A abertura da live contou ainda com a presença do 1º vice-presidente, desembargador Afrânio Vilela; da superintendente adjunta da escola, desembargadora Maria Luíza de Marilac; e dos integrantes do comitê técnico da Ejef, os desembargadores Alberto Vilas Boas e Kárin Emmerich e o juiz auxiliar da 2ª Vice-Presidência, Luís Fernando Benfatti.
Participaram também da abertura o desembargador Moacyr Lobato, coordenador do Centro de Estudos Jurídicos Juiz Ronaldo Cunha Campos; o desembargador Tiago Pinto, 2º vice-presidente eleito do TJMG; a desembargadora Juliana Horta; os diretores Ana Paula Prosdocimi e Fernando Rosa; a gerente de Formação da Ejef, Lorena Belleza; e a coordenadora do Núcleo de Desenvolvimento de Competências Humano-Sociais (Nudhs), Marília Miranda.
Intérprete de libras
A atividade contou ainda com a participação da intérprete de libras Nathali Fernanda Machado Silva, que tornou a palestra da monja Coen acessível a deficientes auditivos.

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