Tribunal de Justiça anula júri em que cliente do advogado Wagner Dias Ferreira havia sido condenado e determina a realização de novo julgamento.
Confira a íntegra da decisão:
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL – JÚRI – DECISÃO MANIFESTAMENTE
CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS – CASSAÇÃO DO VEREDICTO – POSSIBILIDADE. Em que pese constitucionalmente consagrada a soberania
das decisões emanadas do Tribunal do Júri, mas constatado a hipótese de decisão
manifestamente contrária à prova dos autos, impõe-se cassar o veredicto para
submeter o réu a novo julgamento.
Apelação Criminal Nº 1.0301.14.016506-1/001 - COMARCA
DE Igarapé - Apelante(s): LUCIANO DIAS DA SILVA -
Apelado(a)(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Vítima: A.V.M.,
C.G.F., J.V.D.S., J.R.J., S.C.F.
Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA
CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da
ata dos julgamentos, à unanimidade, em DAR PROVIMENTO AO RECURSO.
DES. FORTUNA GRION
Relator.
Des. Fortuna
Grion (RELATOR)
V O T O
O Ministério Público
denunciou LUCIANO DIAS DA SILVA, já qualificado nos autos, como incurso
nas iras do art. 121, § 2º, V, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal, por
cinco vezes, isso porque, teria ele – no dia 09/12/2014, por volta das 21:50
horas, na Rodovia Fernão Dias, nº 42, no Centro de Igarapé/MG – com animus necandi e para garantir a
impunidade de crime, desferido disparos de arma de fogo contra os policiais
Joas, Alexsandro, Clayton, Jonathan e Alessandro, não consumando os delitos por
circunstâncias alheias à sua vontade.
Narra a denúncia que, após a ocorrência de um
tiroteio em razão de disputa por tráfico de drogas no Bairro Jardim das
Roseiras, policiais militares avistaram o acusado e outros dois indivíduos em
fuga, motivo pelo qual deram ordem de parada, contudo, os agentes começaram a
efetuar diversos disparos de arma de fogo contra os brigadianos, não os
atingindo.
Após a
decisão de pronúncia (fl. 179/182), foi Luciano
submetido a julgamento pelo Conselho de Sentença, o qual decidiu por absolver o réu em relação ao delito que vitimou Alexsandro;
condenar o increpado como incurso nas iras do art. 121, §§ 1º e
2º, V, c/c art. 14, II, ambos do CP, por duas vezes, quanto ao crime praticado
contra Joás e Jonathan; e condenar
o acusado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, V, c/c art. 14, II, ambos
do CP, em relação aos delitos praticados contra Clayton e Alessandro,
submetendo-o à pena: privativa de liberdade de 06 anos de reclusão, a
ser cumprida em regime inicial semiaberto (fl. 276/283).
Inconformado,
manifestou o réu o desejo de recorrer (fl. 252). Em suas razões recursais (fl.
291/295), busca a defesa a cassação do julgamento, por ser manifestamente
contrário à prova dos autos. Subsidiariamente, pleiteia a fixação da fração
mínima de aumento pelo concurso formal de delitos.
O
Ministério Público, em contrarrazões (fl. 296/301), manifestou-se pelo
improvimento do recurso, sugerindo a manutenção integral da sentença.
Nesta
instância, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer de fl. 307/325,
opinou pelo desprovimento do Apelo.
É, no essencial, o relatório.
Presentes os pressupostos extrínsecos e intrínsecos
de admissibilidade, conheço do recurso.
Ausentes
preliminares, passo ao exame do mérito do Apelo.
Busca
a defesa a cassação do veredicto popular, por ser manifestamente contrário à
prova dos autos.
Razão
assiste ao recorrente.
Cediço
que as decisões proferidas pelo Tribunal do Júri – juízo natural para o
julgamento dos crimes dolosos contra a vida – são soberanas (art. 5º, XXXVIII,
da CR/88).
Não
obstante a consagrada soberania dos veredictos, a decisão dos jurados, se
manifestamente contrária à prova dos autos, desafiará cassação pelo Tribunal de
Justiça, que remeterá o réu a novo julgamento popular.
Lado outro, não é contrária à prova dos autos, mas nitidamente
soberana, a decisão popular ancorada em elementos coligidos para os autos,
ainda que minoritária a vertente eleita.
Contudo, in casu, a decisão emanada do Conselho de Sentença, que absolveu o
apelante Luciano quanto ao
crime praticado contra Alexsandro; que o condenou por tentativa de
homicídio qualificado privilegiado cometido contra Joás
e Jonathan e que o condenou
por tentativa de homicídio qualificado praticado em desfavor de Clayton
e Alessandro realmente não pode se mantida, pois há um descompasso entre a prova coligida nos autos e
as teses sustentadas pela defesa, em plenário.
De
pronto, registro que a materialidade encontra-se cristalinamente demonstrada
pelo auto de apreensão da arma de
fogo e das munições (fl. 31) e pelos exames
de eficiência em arma de fogo e munições (fl. 160 e 161).
Ouvido em sede embrionária, quando ainda crepitantes
os fatos, o acusado afirmou haver enfrentado os integrantes da gangue de
Jefferson, sendo que, posteriormente, viu policiais em uma viatura
descaracterizada e, pensando se tratarem dos membros do grupo rival, passou a
efetuar disparos de arma de fogo. Asseverou, ainda, haver se deparado com outra
guarnição policial em uma viatura caracterizada, motivo pelo qual parou de
atirar e passou a fugir, não logrando êxito:
“[...]
Perguntado(a) se é verdadeira a imputação que lhe é feita, respondeu QUE sim, esclarecendo
que confundiu os ocupantes da viatura descaracterizada com os integrantes a
gangue de JEFERSON, que havia acabado de enfrentar, no Bairro Jardim das
Roseiras, em Igarapé, durante uma intensa troca de tiros, de aproximadamente
quinze minutos; que, em auxilio ao traficante JÚNIOR, que estava acompanhado do
traficante JULIANO, cada um portando um revólver de calibre 38, resolveram
tomar a boca de tráfico de drogas que pertencia ao traficante CARIOCA, que
havia sido tomada pelo traficante JEFINHO, que conta com cinco integrantes e,
nessa empreitada criminosa, descobriu que JEFINHO está fortemente armado
submetralhadoras, pistolas e revólveres e, em busca da saída do local em
segurança, depararam com a viatura descaracterizada e abriram fogo, julgando se
tratarem de membros da gangue de JEFINHO, tendo o declarante efetuado três
disparas contra a mesma, continuaram a correr e depararam com outra viatura,
onde pararam de atirar e fugiram, atravessando a Rodovia Fernão Dias e pularam vários
muros, mas o declarante, em razão do ferimento, não conseguiu acompanha-los,
que o declarante esclarece que juntamente com os traficantes JÚNIOR e JULIANO
conseguiram atravessar a BR 381, região do Bairro Novo Horizonte, tendo
conseguido pular dois muros, mas, em razão do ferimento em sua coxa esquerda,
não conseguiu acompanhá-los se homiziando na plantação do quintal de uma casa,
que foi cercada pelos Policiais Militares; que, o declarante esclarece que
trocou a arma de fogo com o traficante JÚNIOR, pois sua arma de fogo era mais
nova e a arma do JÚNIOR era uma ‘canela seca’, de qualidade ruim, tendo o
JÚNIOR deixado o revólver debaixo de uma telha, enquanto o declarante se
escondia na plantação; que, o declarante foi localizado e a arma de fogo também
foi localizada; que, o declarante esclarece que tem dois meses de contato com o
traficante JUNIOR, que é um remanescente da quadrilha liderada pelo traficante
CARIOCA; QUE o traficante JEFINHO também pertencia a quadrilha de traficantes
de CARIOCA; QUE, com o assassinato de CARIOCA, a mando de JEFINHO, iniciou-se uma
disputa entre os traficantes JÚNIOR e JEFINHO; que há uma semana, no Centro de
Betim-MG, à tarde, próximo ao Super Luna Ltda, numa pracinha comercial, combinaram
a tomada da biqueira de trafico de drogas do JEFINHO, onde o declarante recebeu
a proposta de se tomar um sócio de JÚNIOR e que costumam se encontrar nesse
local, em Betim, não sabendo informar os seus endereços; QUE, até então não
sabia que o traficante JEFINHO estava tão bem armado; que, chegaram ao local de
táxi, que tomaram em Betirn, na Praça do Ceab; que, usou nome falso, ao ser
abordado pelos Policiais Militares, se passando por MARCELO DIAS, porque tinha
mandado de prisão em aberto, por motivo de ter disparado tiros contra policiais
em vez anterior e temia que os policiais descobrissem esse detalhe e tirassem a
sua vida. [...]” (fl. 09/10)
Em seu depoimento prestado na fase judicial (fl.
120) e confirmado no plenário (fl. 259/260), o increpado aduziu haver se
dirigido a um ponto de venda de drogas juntamente com dois conhecidos, sendo
que alguns indivíduos efetuaram disparos de arma de fogo quando o avistaram,
motivo pelo qual empreendeu fuga e se deparou com um carro, momento em que um
de seus parceiros desferiu tiros. Aduziu, ademais, haver desferido 03 disparos
de arma de fogo para se defender.
Sempre que inquirido, a vítima Joás relatou haver
recebido ordens para apoiar uma viatura em um local onde ocorreu um conflito de
gangues de traficantes de drogas, Asseverou, ainda, haver para lá se dirigido
em uma viatura velada, sendo que, ao chegar no local, se deparou com 03
indivíduos, os quais passaram a efetuar disparos de arma de fogo. Informou,
ademais, que os agentes se depararam com policiais que estavam em uma viatura
caracteriza e também desferiram disparos de arma de fogo. Vejamos:
“[...] QUE a respeito do fato noticiado através do REDS supra,
declarou que recebeu ordens para apoiar a viatura da 7ª Cia. Ind. PMMG e
deslocou-se para Igarapé, Bairro Jardim das Roseiras, onde ocorria um conflito
entre gangues de traficantes de drogas; que, utilizou, juntamente com a sua
equipe, uma viatura velada ou descaracterizada; que, ao se aproximar do local
em que estava a Equipe 17211, fez contato e passou pelos mesmos, seguindo um pouco
mais adiante deles e depararam com três cidadãos caminhando a pé, em atitude
suspeita, ou seja, ‘ouriçados, mãos na cintura’, momento em que parou a viatura
e ao sair, um dos cidadãos sacou um revólver, tendo o declarante voltado para o
interior da viatura novamente, quando os três abriram fogo contra os mesmos,
que disparavam e saiam correndo, vindo os mesmos depararem com a viatura 17211
e continuarem a disparar contra aqueles policiais também e fugiam atravessando
a BR 381, sendo vistos pelos Policiais Militares da 17211, pulando muros de
residências; que, foi feito cerco no local, tendo sido encontrado um dos
autores, que apresentava ferimento na coxa esquerda, e, próximo do mesmo,
encontrado uma das armas do crime, revólver de calibre 38, com cinco munições
deflagradas e uma intacta; que, a principio o autor dos disparos
identificou-se por MARCELO DIAS, tendo sido descoberta a sua real identidade,
LUCIANO SILVA DIAS, que confirmou que efetuou disparos contra as viaturas
policiais; que, LUCIANO disse que pretendia retomar a boca de tráfico de drogas
que lhe pertencia e trocou tiros com a gangue rival e, após o conflito,
procurava sair do local, quando deparou com a viatura velada e abriu fogo,
julgando que seus ocupantes fossem membros da outra gangue, mas, ao deparar com
mais policiais à frente, continuou, junto com os seus dois cúmplices a
dispararem tiros contra os mesmos para ganharem espaço para fugir, mas como
estava ferido, foi localizado, com a arma do crime. [...]” (Inquérito – fl. 06)
“[...] QUE: a respeito do fato noticiado através do REDS supra,
declara que
prestou depoimento às fls. e fls. destes autos e acrescenta que, no momento em
que deflagrem a operação policial, estava no interior da viatura
descaracterizada, quando avistaram os três indivíduos caminhando pela Rua Silva
Couto, com sentido à BR 381, em atitude suspeita; que, ao pararem a viatura
para descerem, viu que os indivíduos sacaram armas de fogo, cada um, e
efetuaram disparos contra os mesmos e passaram a saírem correndo juntos, no
mesmo sentido, quando o declarante e sua equipe revidavam com disparos contra
eles também; que, os infratores depararam com a viatura caracterizada e
continuaram a dispararem tiros contra os integrantes da mesma, e continuavam
fugindo, atravessaram a BR 381; que, os Policiais Militares fardados
acompanhavam a fuga dos três indivíduos, tendo sofrido a influencia da grande
circulação de veículos da Rodovia Fernão Dias, fator que contribuiu para que os
fugitivos tivessem distanciado dos mesmos, mas mesmo assim foi feito cerco ao
local onde foram vistos pularem muros residenciais, tendo sido um dos
infratores localizado no quintal de uma das residências, baleado na coxa
esquerda, que se identificou por
LUCIANO e recebeu voz de prisão em flagrante delito, tendo sido encontrada uma
arma de fogo no local do homizio deste; que, o declarante, na operação, estava
usando uma pistola PT .40, tendo efetuado cinco disparos com a mesma. [...]” (Inquérito
– fl. 55/56)
“[...] que o depoente recebeu uma solicitação de apoio da policia
militar de Igarapé, vez que estavam ocorrendo no bairro das Roseiras uma troca
de tiros entre marginais; que quando chegou ao local, o depoente ali encontrou
uma outra viatura; que antes mesmo de desembarcar, o depoente e seus colegas de
trabalho foram alvos de disparos de arma de fogo; que então, foi necessário que
os policiais também atirassem contra os agressores; que depois de cessada a
troca de tiros, teve início um rastreamento que resultou na localização e
prisão do acusado; que foi encontrada uma arma de fogo com o acusado; que o
acusado foi encontrado escondido em um lote e a arma de fogo estava ao lado
dele; que reconheceu o acusado como sendo uma das pessoas que atiraram contra
os policiais; que inicialmente, o acusado estava dando o nome do irmão;
que depois de o depoente fazer uma consulta ao sistema, verificou que o nome
dado estava envolvido em um acidente de trânsito na Cristiano Machado; que como
o acusado disse que não era habilitado, o depoente desconfiou que ele estava
dando nome errado; que depois de pressiona-lo, o acusado acabou se
identificando corretamente, dizendo que estava dando o nome do irmão porque
havia se envolvido numa troca de tiros com policiais em Juatuba/MG; que o
acusado disse que efetuou os disparos contra a viatura em que o depoente estava
porque acreditava que o depoente e seu outro colega de trabalho, que estavam a
paisano, seriam os rivais dele, com os quais ele havia trocado tiros momentos
antes; que o depoente e seu colega estavam numa viatura descaracterizada, vez
que atua no serviço de inteligência da policia. [...] que o depoente
chegou ao local 20 ou 30 minutos depois de ter recebido a mensagem a respeito
da troca de tiros do bairro Roseiras; que o depoente estava no bairro
Bandeirinhas, em Betim, quando recebeu a mensagem; que a troca de tiros na qual
o depoente esteve envolvido ocorreu em local distante do bairro Roseiras; que a
pé, entre um lugar e outro, demoraria uns 20 minutos para se chegar; que
os primeiros disparos foram efetuados assim que o depoente e o policial
Alessandro desceram da viatura descaracterizada; que os três agressores estavam
do outro lado da rua quando começaram a atirar; que os agressores atiraram para
correr; que naquele momento os agressores não tinham contato visual com a
viatura caracterizada; que só passaram a ter uns dez metros depois; que muitos
disparos foram efetuados pelos agressores, com certeza mais de dez; que também
foram efetuados disparos contra os militares fardados; que acredita que
Luciano foi atingido na troca de tiros com os policiais porque ele havia
passado normalmente diante do depoente e de seus colegas; que o próprio acusado
disse que a troca de tiros ocorrida no bairro Roseiras estava relacionada a
disputa por uma boca de fumo. [...]” (Juízo – fl. 114)
Nesse mesmo viés, são os depoimentos prestados por
Alexsandro, ao afirmar que o réu efetuou disparos de arma de fogo em direção a
todos os policiais:
“[...] QUE
a respeito do fato noticiado através do REDS supra, declara que é o Comandante
da Viatura 17.211, que estava em apoio à 7ª Cia. Ind. PMMG, empenhada numa
situação de conflito entre gangues rivais de tráfico de drogas, com troca de
tiros; que, chegando na cidade de Igarapé-MG, deparou com três indivíduos
armados, em fuga, que efetuaram disparos contra a viatura e atravessaram a BR
381, sendo vistos do outro lado da Rodovia Fernão Dias, pulando muros
residenciais; que, fizeram cerco ao local do homizio dos infratores, tendo
logrado êxito em localizar um deles com a arma de fogo utilizada no crime;
que, o autor dos disparos confessou a prática delitiva e que tentava resgatar
uma boca de tráfico de drogas que foi sua, mas após o conflito com a gangue
rival, tentavam sair do local, quando depararam com os policiais e abriram fogo;
que, a principio o abordado deu nome falso, sendo descoberto o verdadeiro nome
e a existência de mandado de prisão em aberto para o mesmo; que o condutor
deste auto deu-lhe voz de prisão em flagrante delito, recolheu a arma de fogo,
revólver calibre 38. com cinco munições deflagradas e uma intacta e o
apresentou à Autoridade Policial para as providências cabíveis. [...]” (Inquérito
– fl. 08)
“[...] QUE:
a respeito do fato noticiado através do REDS supra, declara que prestou
declaração sobre o fato às fls. e fls. destes autos e confirma o inteiro teor
de sua declaração; que, a viatura policial estava parada próximo à JAC VEICULOS,
sentido Igarapé-Betim, na Rua Perfila Vencesláu do Prado; que, o
declarante estava do lado de fora da viatura, atrás da mesma, quando observou
três indivíduos correndo em sentido de travessia à BR 381, após efetuarem
disparos contra a seção de inteligência, a viatura descaracterizada que estava
a aproximadamente trinta metros de distancia, à frente da viatura do
declarante, na Rua Silva Couto; que, ao avistarem a viatura do declarante, os
três indivíduos continuaram a efetuar disparos de arma de fogo contra os mesmos
e correndo ao mesmo tempo, atravessando a BR 381, desafiando a Policia
e até mesmo as suas próprias vidas e as vidas de terceiros, cujas vias públicas
estavam com grande movimentação de veículos nos dois sentidos; que, o
declarante e sua equipe paravam de disparar suas armas sempre que carros
passavam nas vias de transito em meio à troca de tiros, mas os infratores não
estavam tendo esse cuidado, continuavam a dispararem, sem parar, sem considerar
os usuários do transito; que, o declarante e sua equipe demoraram de chegar aos
infratores em fuga em razão ao movimento de transito da BR 381; que, o
declarante efetuou nove disparos de arma de fogo, tendo como alvo os três
infratores ao mesmo tempo, através de sua pistola PT TRA62499, de 9mm, nos
seguintes tempos; primeiro, quando os autores estavam em meio à grama no
canteiro da BR e depois quando pulavam a mureta central da BR 381; que. a
circulação de veículos diversos, nos dois sentidos da BR 381 foi um obstáculo
ao sucesso da operação. [...]” (Inquérito – fl. 46/47)
“[...] que
na data dos fatos, o depoente estava em Betim e foi prestar apoio à Polícia
Militar de Igarapé, pois estava ocorrendo uma troca de tiros entre gangues; o
depoente estava numa viatura caracterizada e foi recebido próximo à Rodovia com
muitos disparos de arma de fogo; durante os disparos, o depoente e seus colegas
de farda se abrigaram atrás da viatura e revidaram os disparos; o depoente
parava de revidar quando vinha carros na Rodovia; ‘um dos meliantes se escondeu
e foi capturado’ por outros policiais; foram muitos disparos efetuados contra
os policiais; tomou conhecimento que o acusado já havia trocado tiros
com um Delegado em Juatuba; eram três os agressores, mas um só foi encontrado;
pela roupa, o acusado era um dos agressores; com o acusado foi encontrado um
revólver; não sabe se o revólver estava na cintura do acusado porque foi outra
guarnição que o encontrou. [...] que não sabe dizer se a troca de tiros começou
com os policias da viatura descaracterizada; a viatura não foi atingida; nenhum
policial foi atingido pelos disparos; no entanto, havia uma agência de veículos
próximo ao local que foi atingida pelos disparos; durante a fuga, os agressores
‘deram tiro à vontade’; um dos agressores chegou a ficar entrincheirado, mas
correu quando uma carreta passou na Rodovia 381. [...]” (Juízo – fl. 113)
Por sua vez, a vítima Clayton, declarou estar em uma
viatura caracterizada, sendo que o acusado efetuou disparos de arma de fogo
contra os policiais que estavam na viatura caracterizada, bem ainda contra os
que estavam na viatura descaracterizada:
“[...] QUE: a respeito do fato noticiado através do REDS supra,
declara que corrobora a declaração prestada pelo Sr. Alexsandro José Rodrigues,
e acrescenta que estava utilizando a espingarda calibre 12. tendo efetuado
quatro disparos contra os alvos; que, o fluxo de veículos era intenso quando
deflagrou a operação, tendo o declarante trocado de arma, uma PT, com a qual
efetuou mais dois disparos; que, a circulação de automóveis nos dois
sentidos da BR 381 foi um obstáculo ao sucesso da operação, tendo a outra
equipe logrado êxito em localizar o infrator baleado; que, o declarante não tem
condições de informar quem acertou o infrator localizado. [...]” (Inquérito –
fl. 49/50)
“[...] que recebeu uma solicitação de apoio porque estava ocorrendo
troca de tiros entre traficantes no bairro Roseiras; que o depoente estava numa
viatura caracterizada e aguardou a chegada dos policiais da P2; que quando os
policiais da P2 chegaram ao local, assim que desembarcaram, foram alvos de
disparos de arma de fogo; que o depoente e os demais policiais fardados também
foram alvos de disparos; que os policiais revidaram; que os agressores
atravessaram a BR 381; que aumentou o fluxo de veículos, o que impediu
os policiais de continuar a perseguição dos agressores a fim de evitar que
pessoas que passavam no local fossem atingidas; que eram três agressores; que reconheceu
o acusado como um dos agressores; que foi encontrado um revólver com o acusado;
que foi outra equipe que localizou o acusado no interior de uma residência.
[...] que a viatura do depoente não foi diretamente para o bairro Roseiras
porque a informação recebida é de que era ocorrência de vulto, uma troca de
tiros intensa; que então a viatura ficou posicionada aguardando a chegada de
reforços; que no momento em que os disparos começaram, o depoente e seus
colegas tiveram que se abrigar atrás da viatura; que nesse momento os
agressores aproveitaram para tomar a direção da BR 381; que é difícil dizer se
os agressores já estavam se dirigindo a BR 381 antes de efetuarem os disparos;
que segundo o acusado Luciano, eles estavam saindo do bairro Roseiras quando se
depararam com as equipes de policiais; que a distância entre os policiais e os
agressores era de no máximo 15
metros ; que nenhum policial e nenhuma viatura foram
atingidas pelos disparos [...]” (Juízo – fl. 115)
“[...] o depoente estava com as demais testemunhas no dia dos fatos
em uma viatura caracterizada, sendo que havia, além da viatura do declarante,
outra viatura caracterizada e uma descaracterizada, com integrantes da P2; os
disparos foram direcionados às três viaturas; nenhum disparo atingiu as
viaturas; os autores começaram a atirar assim que avistaram as viaturas; os
policiais revidaram, sendo que um dos autores foi atingido; o apoio do
BPE foi solicitado porque houve notícias de uma guerra entre gangues e a
polícia militar local não tinha efetivo para intervir; o autor que foi atingido
foi preso com uma arma de fogo, na qual havia cartuchos deflagrados. [...] a
troca de tiros entre traficantes ocorria em local mais distante de onde houve o
confronto da Polícia Militar com os autores dos dispares; os autores estavam a
pé; outra guarnição é que encontrou a arma de fogo com o autor atingido; [...]”
(fl. 235)
Ouvido em sede embrionária, quando ainda crepitantes
os fatos, a vítima Alessandro afirmou estar na guarnição da viatura
descaracterizada, sendo que, ao avistar três indivíduos em atitude suspeita, os
enquadraram, momento em que os agentes passaram a efetuar disparos de arma de
fogo e a correr. Em seguida, os meliantes se depararam com a guarnição na
viatura caracterizada e efetuaram novos disparos para evadir do local, porém os
policiais conseguiram encontrar o increpado:
“[...] QUE: a respeito do fato noticiado através do REDS supra.
declara que estava no interior da viatura descaracterizada. tendo observado que
a viatura caracterizada estava parada na Rua Perina Venceslau do Prado, próximo
à JAC VEÍCULOS, tendo a viatura descaracterizada saído dessa via e acessado a
Rua Silva Couto, quando o declarante e seus colegas de trabalho avistaram três
indivíduos em atitude suspeita, caminhando à pé, sentido contrario, com ares de
aflição, momento em que pararam a viatura e viram que os mesmos tiraram, cada
um, arma da cintura, momento em que os enquadrou, tendo os mesmos passado a
dispararem tiros contra o declarante e sua equipe e passaram a correr ao mesmo
tempo; que. o declarante e sua equipe revidaram os disparos; que, os infratores
percorreram o mesmo sentido, Rua Silva Conto até atravessarem a BR 381; que, os
infratores depararam com a viatura caracterizada e continuaram a efetuar
disparos e correr, atravessando a BR 381, com grande circulação de veículos nos
dois sentidos, havendo troca de tiros e, posteriormente um dos infratores foi
alcançado, homiziado num quintal de residência do outro lado a Rodovia Fernão
Dias e foi preso em flagrante delito por integrantes da viatura
caracterizada, após um cerco que foi feito ao local do homizio; que, o declarante
utilizou a arma PT.40, nº ESA-01015, tendo efetuado seis disparos contra os
alvos que corriam juntos. [...]” (fl. 53/54)
Do mesmo modo, a vítima Jonathan, que estava na
viatura caracterizada, relatou como se deram os fatos, sempre que inquirido:
“[...] QUE: a respeito do fato noticiado através cio REDS supra, declara
que corrobora a declaração prestada pelo Sr. Alexsandro José Rodrigues, e acrescenta
que estava utilizando a pistola de 9mm, tendo efetuado cinco disparos contra os
alvos, tendo, em alguns momentos ficado inerte, mesmo ante a agressão contra os
mesmos devido a grande circulação de veículos nas pistas da Rodovia Fernão Dias
e a existência de residências e transeuntes; que, a circulação de veículos e
pessoas contribuíram para a fuga dos indivíduos, tendo os integrantes da outra
viatura policial logrado êxito em encontrar o infrator que estava baleado,
homiziado no quintal de uma residência; que, ao deparar com a situação de ver
os infratores efetuando disparos contra a primeira viatura e em seguida contra
a sua equipe, o declarante estava na posição paralela à sua viatura, no lado do
passeio. [...]” (Inquérito – fl. 51/52)
“[...] que na data dos fatos, recebeu um pedido de apoio em lgarapé
porque havia urna denúncia de que duas gangues estavam trocando tiros, em
disputa de uma boca de fumo; foi marcado um local para encontro das viaturas de
apoio; o declarante parou sua viatura e outra viatura descaracterizada parou um
pouco mais adiante; três homens começaram a atirar contra uma viatura
descaraterizada, que estava um pouco mais a frente; então, os homens que
atiraram correram e se depararam com a viatura do declarante; os agressores,
então, começaram a atirar também contra a viatura do declarante; o declarante
conversou, depois, com Luciano e ele disse que atirou contra a viatura
descaracterizada porque acreditava que ali estavam seus desafetos, com os quais
havia trocado tiros anteriormente; a viatura do declarante era caracterizada; o
declarante reconheceu Luciano corno sendo um dos três agressores; o
acusado foi preso dentro do terreiro da casa de um civil; havia, salvo engano,
uma arma de calibre 38 com Luciano. [...] que não sabe qual a distância entre o
bairro Roseiras e o local onde houve troca de tiros com a Polícia; os policiais
não esperaram encontrar os agressores naquele local, próximo à Rodovia 381; não
sabe se outra viatura foi até o bairro Roseiras; nenhum policial foi baleado;
nenhuma viatura foi atingida; o acusado foi atingido, salvo engano, na perna
direita, durante a troca de tiros com os policiais; o declarante viu quando o
acusado foi atingido; não tem como precisar qual policial atingiu o acusado
porque havia uma troca de tiros envolvendo os agressores e os policiais; salvo
engano, o acusado só deixou de utilizar urna das munições que estavam no
revólver; acredita que o acusado não resistiu à abordagem policial quando foi
encontrado na residência na qual se escondeu; os policiais procuraram se
abrigar e saíram em perseguição aos agressores depois de visualizá-los; os
agressores atiraram quando estavam fugindo; os policiais atravessaram a BR 381,
o que dificultou a perseguição, pois transeuntes poderiam ser atingidos; que
depois de atravessar a Rodovia 381 os agressores pararam de atirar. [...]”
(Juízo – fl. 116/117)
“[...] o declarante era um dos integrantes das viaturas que foram alvo de
disparos de arma de fogo na Cidade de Igarapé, estando o declarante em uma das viaturas
caracterizadas; que viu três pessoas atirando contra as viaturas; que
inicialmente os disparos foram direcionados contra os militares que se
encontravam na viatura descaracterizada havendo pronto revide do declarante e
dos demais militares, porque logo depois os disparos foram direcionados contra
as viaturas caracterizadas, uma vez que os militares à paisana buscaram abrigo
nas viaturas caracterizadas; que pode afirmar que o acusado que foi preso era
um dos autores dos disparos contra os militares, acrescentando que viu
bem o seu rosto no momento em que o acusado foi alvejado na perna. [...]”
(Juízo – fl. 233)
A seu turno, em seu depoimento prestado após a
pronúncia, a testemunha Robson também relatou como se deram os fatos:
“[...] no ano de 2014 era integrante do BPE; a guarnição do declarante se
dirigiu para a cidade de Igarapé em razão de uma comunicação via rádio da
existência de uma guerra entre gangues com troca de tiros; foi o declarante o
responsável pela apreensão da ama de fogo, a qual se encontrava a
aproximadamente quatro metros de distância do acusado, que estava encostado no
muro; a arma foi localizada exatamente embaixo de uma telha de amianto, que
estava encostada o muro; no início da abordagem verificou duas pessoas pulando
o muro, seguindo-as; ao pular também o muro, deparou com o acusado caído e o
indagou onde estava o comparsa, obtendo a resposta de que ele tinha se evadido;
que ainda deu tempo de ver o comparsa fugindo e as marcas de pé no muro, sendo
que a arma estava escondida próximo do local onde ele fugiu; por este motivo
acredita que a arma encontrada estava de posse do comparsa do acusado que fugiu
e também pelo fato de que o acusado estava machucado e não havia marca de
sangue entre o local onde ele se encontrava e local onde foi apreendida a arma;
indagou ao acusado o motivo pelo qual este teria efetuado disparos contra a
Polícia Militar, tendo o acusado dito que efetuou os disparos porque acreditava
que a viatura descaracterizada continha em seu interior integrantes da gangue
rival, com quem haviam trocado tiros momentos antes. [...]” (fl. 234)
Portanto, constata-se que as vítimas e as
testemunhas afirmaram, em um só coro, que o réu efetuou disparos de arma de
fogo contra todos os policiais, tanto quanto os que estavam na viatura
caracterizada, quanto os que estavam na viatura descaracterizada.
Vale destacar que o próprio acusado admitiu haver
efetuado disparos de arma de fogo contra os membros da guarnição policial que
estavam em uma viatura descaracterizada.
Não obstante, observa-se que Conselho de Sentença absolveu o réu quanto à
tentativa de homicídio qualificado praticada contra Alexsandro, que
estava em uma viatura caracterizada; o condenou por tentativa de
homicídio qualificado privilegiado, por haver o increpado agido sob o domínio
de violenta emoção, após injusta provocação da vítima, quanto aos ofendidos Joás,
que estava em uma viatura descaracterizada, e Jonathan, que estava em
uma viatura caracterizada, e, finalmente, condenou
o increpado por tentativa de homicídio qualificado praticado contra Clayton,
que estava em uma viatura caracterizada, e Alessandro, que compunha a
guarnição da viatura descaracterizada.
Logo, embora
saibamos viger para os jurados – diferentemente do juiz togado, que deve
fundamentar suas decisões – o princípio do livre
convencimento íntimo e o da livre apreciação das provas, certo é
que também para eles é defeso decidir arbitrariamente.
A propósito, o
trato pretoriano:
“HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO
AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1.
[...] 2. JÚRI. ABSOLVIÇÃO. DECISÃO
MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA
À PROVA DOS AUTOS. PROVIMENTO DO
RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. OFENSA À
SOBERANIA DOS VEREDITOS.
NÃO OCORRÊNCIA. TESE DE LEGÍTIMA DEFESA. AUSÊNCIA DE
PROVAS. ÍNTIMA CONVICÇÃO. IMPRESCINDIBILIDADE
DE COMPATIBILIZAÇÃO COM O DIREITO PENAL.
AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 3. HABEAS CORPUS
NÃO CONHECIDO. [...] Apesar da possibilidade de o
Júri simplesmente absolver o acusado, com
fundamento em sua íntima convicção, referida
decisão, a despeito de acobertada pelo manto da
soberania dos vereditos, não está blindada contra a
interposição de recursos, os quais podem e devem
ser analisados pelo Tribunal de origem de acordo
com a disciplina penal. Assim, mostra-se patente a
possibilidade de absolvição do paciente sem que o
Conselho de Sentença precise justificar seu
convencimento. No entanto, a decisão não prescinde de
apoio nos elementos dos autos, razão pela qual,
verificada que está dissociada das provas produzidas,
cabe ao Tribunal reconhecer referida contrariedade,
para que o paciente seja submetido a novo julgamento.
Dessarte, não verifico constrangimento ilegal. 3. Habeas
corpus não conhecido.”
(STJ, 5ª Turma, HC 226526/ES, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, j.
em 20/06/2013, pub. DJe de 28/06/2013)
“JÚRI - RECONHECIMENTO DA AUTORIA E MATERIALIDADE - ABSOLVIÇÃO SEM AMPARO EM EXCLUDENTE
DE ILICITUDE E CULPABILIDADE - DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS
AUTOS - CASSAÇÃO - POSSIBILIDADE. - Sendo a única tese de defesa, e da
autodefesa, voltada para a negativa de autoria e tendo o Conselho de Sentença
reconhecido o apelante como autor do homicídio tentado, evidentemente que não
poderia absolvê-lo da imputação, pois, conquanto
os jurados julguem por íntima convicção, estão jungidos às
teses defensivas debatidas em plenário, ou emergentes dos interrogatórios do
réu. (TJMG, 2ª C. Crim., Apelação Criminal nº 1.0396.09.045880-5/002,
Rel.ª Des.ª Beatriz Pinheiro Caires, j. em 08/09/2011, pub. DJe de 21/09/2011).
Nesse
contexto, conclui-se haver um nítido descompasso entre toda a prova amealhada
aos autos e as teses acolhidas pelo Conselho de Sentença.
Por
oportuno, ressalto que, se o Conselho de Sentença se decidir por nova
condenação, não poderá o magistrado impor penas mais gravosas do que aquelas
fixadas na decisão rescindida, sob pena de se incorrer em reformatio in
pejus indireta.
Mercê de tais considerações, DOU PROVIMENTO ao recurso para cassar a decisão do Júri, devendo Luciano
ser levado a novo julgamento.
Custas ex lege.
Desa. Maria Luíza De Marilac (REVISORA) - De acordo com o(a)
Relator(a).
Des. Octavio Augusto De Nigris Boccalini - De acordo com o(a)
Relator(a).
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