Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) nega provimento a recurso ministerial,
mantendo a absolvição de dois clientes
do advogado Wagner Dias Ferreira, ante a aplicação do princípio in dúbio pro
reo – na dúvida, decida-se a
favor do réu. Leia a decisão na íntegra:
Apelação Criminal Nº 1.0024.10.102605-2/001 - COMARCA
DE Belo Horizonte -
Apelante(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - Apelado(a)(s):
REGINALDO RODRIGUES DE MACEDO, RENAN HENRIQUE RODRIGUES SALVIANO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª
CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na
conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL
Relator.
Des.
Antônio Carlos Cruvinel (RELATOR)
V O T O
Presentes os pressupostos de sua
admissibilidade, conhece-se do recurso.
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Órgão Ministerial em
face da sentença de fls. 194/196 que julgou improcedente a denúncia e absolveu
Renan Henrique Rodrigues Salviano e Reginaldo Rodrigues de Macedo, da imputação
prevista no artigo 33, caput, e
artigo 35, ambos da Lei 11.343/06, com fulcro no artigo 386, VII, do CPP.
Nas razões de fls. 206/209, requer a reforma da sentença para condenar
os apelados, nas sanções do artigo 33, caput,
da Lei 11.343/06, sustentando para tanto, que a autoria é induvidosa.
Razão não assiste ao Órgão Ministerial.
A materialidade restou devidamente comprovada pelo laudo de constatação
de fl. 16, bem como pelo laudo toxicológico definitivo de fl. 31. Contudo, no
tocante à autoria, não se pode dizer o mesmo.
Em seu interrogatório em juízo, o acusado Reginaldo Rodrigues de Macedo sustentou:
“(...) que os fatos narrados na denúncia não são
verdadeiros; que o interrogado morava
no aglomerado Vila Querosene e estava no local da data dos fatos; que o
acusado Renan era amigo de infância do interrogando e na data dos fatos estava
indo ao seu encontro; que estavam
debaixo de uma marquise esperando a chuva passar; que foram abordados por
policiais militares que estavam em uma viatura; que não se recorda
exatamente, mas acha que foi abordado mais uma pessoa, além do interrogando e
do acusado Renan; que foi apreendido o valor de R$311,00 que estava com o
interrogando; que o acusado Renan estava com a quantia aproximada de R$30,00; que não presenciou os militares
encontrando a maconha e o crack; que os militares mostraram apenas a
maconha para os acusados; que não
assumiu a propriedade da maconha; que no momento das buscas o
interrogando e o acusado estavam um do lado do outro; que com o acusado Renan não foi encontrada nenhuma droga; que o interrogado estava de costas para
o muro e que não sabe informar se o acusado Renan presenciou os militares
encontrando a droga; que faz uso de maconha de vez em quando, depois do
serviço; que trabalha de segunda a sábado das 07h30min às 19h30min e aos
sábados até as 14horas; que não tem conhecimento se a Rua Assembléia é
conhecida como ponto de tráfico de drogas; que
estavam indo para um baile e estavam apenas esperando a chuva passar;
que não tem nenhuma desavença com nenhum dos policiais que fizeram a abordagem
e a prisão; que quando chegou a delegacia ficou detido por um tempo e depois
liberado; que na data dos fatos não residia mais na Vila São José, Morro do
Querosone; que estavam no local
combinando com o acusado Renan para irem ao centro da cidade a uma festa;
que o Renan morava em frente ao local
da abordagem (...)”. (fl. 161/162) (Grifos nossos)
Do mesmo modo, o acusado Renan Henrique Rodrigues Salviano,
afirmou sob o crivo do contraditório:
“(...) que
os fatos constantes da denúncia são parcialmente verdadeiros; que foi abordado em frente à sua
residência e que o acusado Reginaldo estava vindo para irem a uma festa;
que foram abordados um pouco abaixo
da casa do interrogando; que no momento estava chuviscando; que outras pessoas foram abordadas no
mesmo local; que efetuaram buscas no interrogando e com ele foi
encontrada apenas a quantia de R$36,00; que
com Reginaldo também não foi encontrada nenhuma droga, apenas uma quantidade em
dinheiro; que existe uma obra em construção que fica de 20 a 30 metros do local onde o
interrogando foi abordado; que o
interrogando viu os militares entrando na obra e logo depois voltaram com a
droga e mostraram aos acusados; que eles estavam com um plástico na
mão; que antes de sua prisão usava maconha e cocaína; que nenhum dos acusados assumiu a propriedade da droga; que
não conhecia os militares que fizeram a abordagem; que a abordagem ocorreu por
volta de 19horas; que o interrogando não sabe informar se o local é conhecido
como ponto de venda de drogas porque trabalha o dia todo; que nunca teve
nenhuma desavença com nenhum policial militar (...)”. (fls. 163/164) (Grifos
nossos)
Verifica-se
que os acusados negaram a autoria do delito.
Diferentemente
do alegado pelo Órgão Ministerial, não existe nenhuma prova insofismável no
sentido de que a droga apreendida pertencia aos acusados. Vejamos.
Do
depoimento do policial militar Washington
Lucas Castor, se extrai:
“(...) que devido ao tempo não conhece nenhum
dos acusados presentes nesta audiência; que confirma o histórico do BO
de fl. 12 que lhe fora lido nesta assentada; que não conhecia os acusados antes
da data dos fatos; que não se recorda
se os acusados assumiram a propriedade da droga; que está na polícia há
09 anos, desde janeiro de 2004; que trabalha na região da abordagem há oito
anos; que a rua Assembléia possui becos que encontram com a rua; que o local é conhecido como ponto
intenso de tráfico de drogas; que já fez outras abordagens e apreensões
de drogas no local; que além das quantias em dinheiro, foram apreendidos
maconha e crack; que não se recorda
se havia outras pessoas no local, no momento da abordagem; que não se
recorda se estava chovendo naquela data; que
não se recorda se entraram em uma construção abandonada para arrecadar a droga;
que acredita que não estava chovendo na data dos fatos porque o depoente
trabalha de moto e não sai quando está chovendo; que já trabalhou na viatura
Blazer; que não foi efetuada buscas na residência do acusado Renan porque não
estava de posse de mandado judicial; que
não pode precisar exatamente a distância de onde foi feita abordagem do local
onde a droga foi arrecadada; que confirma os termos do BO de que não foi encontrada nenhuma droga com
os acusados (...)”. (fl. 165) (Grifos nossos)
O policial militar Gerson Borges Bernardes
disse em juízo:
“(...) que não reconhece os acusados presentes
nesta audiência; que confirma o teor do histórico da ocorrência de fl.
12, embora não se recorde dos fatos; que o local em que foi feita a abordagem à
rua Assembléia, na Vila Querosene é conhecido como ponto de tráfico de drogas;
que o depoente já realizou abordagens com apreensão de drogas e armas no mesmo
local; que trabalha na região há aproximadamente 12 anos; que não tem noção da distância onde foi feita a abordagem e onde a
droga foi encontrada; que existe um imóvel sem morador na esquina da
rua Assembléia; que não se recorda
onde estava localizada a droga; que não se recorda se estava chovendo;
que não se recorda porque não foi efetuada buscas na residência do acusado
Renan (...)”. (fl. 166) (Grifos nossos)
E por fim, o policial civil José Luiz
Soares, asseverou também em juízo:
“(...) que
confirma os termos do relatório circunstanciado de fl. 83 e 84; que a rua
Assembléia foi beneficiado com infra estrutura e atualmente diminuiu o tráfico
de drogas no local; que antes da data dos fatos a rua Assembléia já era
considerada “ponto quente” do tráfico de drogas; que não se recorda de nenhum fato relacionado às prisões;
que não sabe informar se estava ocorrendo o tráfico de drogas no momento da
abordagem dos acusados pelos militares; que
acredita que quando o delegado ouve as pessoas e libera logo após é porque não
houve convicção formada de que a pessoa seria traficante (...)”. (fl.
167) (Grifos nossos)
Depreende-se
dos depoimentos transcritos que os policiais militares não reconheceram os
acusados, tampouco se lembraram de como ocorreram os fatos. Ressalta-se,
ademais, que não havia denúncias anônimas, e nenhuma testemunha que afirme
serem os acusados como sendo traficantes de drogas.
Não há,
portanto, nos autos do processo, provas suficientes para impor uma condenação
tão grave e pesada quanto à do delito de tráfico de droga aos acusados.
A
imprecisão probatória é um sinônimo de ausência de prova suficiente para a
condenação, sendo princípio basilar do processo penal que uma pessoa somente
pode ser condenada quando estabelecidas, de modo cabal e incontroverso, a
autoria e materialidade do delito.
A
condenação deve basear-se num cunho de certeza, e não em probabilidades e
possibilidades. Havendo dúvida, por menor que seja, a absolvição é medida que
se impõe.
Neste
sentido, são as decisões do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
APELAÇÃO CRIMINAL - TÓXICOS -
AUTORIA INCERTA - FRAGILIDADE DA PROVA PRODUZIDA - ELEMENTOS DE CONVICÇÃO
INSUFICIENTES A DEMONSTRAR A AUTORIA DELITIVA - EXISTÊNCIA DE DÚVIDA -
ABSOLVIÇÃO - RECURSO PROVIDO. -Não sendo possível atribuir, com segurança, ao
réu a propriedade da substância entorpecente apreendida, a sua absolvição se
impõe. (AP 1.0283.08.008800-0/001(1) – Rel.
Des. Beatriz Pinheiro Caires – Julg. 08/10/09)
Em
matéria criminal, a dúvida caminha em favor do réu, observando-se o princípio
do “In Dúbio Pro Reo”.
Eis a
jurisprudência:
“Em
matéria criminal tudo deve ser preciso e certo, sem que ocorra possibilidade de
desencontro na apreciação da prova. Desde que o elemento probante não se
apresenta com cunho de certeza, a absolvição do réu se impõe”
(TJSP – AC – Rel. Hoeppner Dutra – RJTSP 10/5450).
Assim, mantêm-se as absolvições de Reginaldo Rodrigues de Macedo e Renan
Henrique Rodrigues Salviano, pela imputação prevista no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06, nos exatos
termos da sentença hostilizada.
Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
Des. Paulo Cézar Dias (REVISOR) - De acordo com o(a)
Relator(a).
Des. Antônio Armando Dos Anjos - De acordo com o(a)
Relator(a).
SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO"
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