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sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Encarceramento em massa após a Lei Anticrime - Artigo de Alexia de Castro

Compartilho aqui um artigo muito pertinente escrito pela estudante de direito, Alexia de Castro.

Desde a Copa das Confederações em 2013, quando as manifestações de rua hostilizavam pessoas que ali estivessem expressando um pensamento mais progressista ficou claro que era necessário despertar no seio da população pessoas com a força desses compromissos de caráter mais coletivo. Pessoas que ultrapassando os limites do próprio indivídualismo se lancem no pensar e agir em prol da coletividade.

Alexia, acadêmica de Direito, faz este autolançamento, mostrando uma forte sensibilidade e preocupação social, e tomando como referência a categoria mais rejeitada, que é o setor carcerário. Disposta a suportar a crítica social a si mesma por abordar o tema, enfrenta seus medos, analisa com excelência os dados disponíveis e se posiciona de forma progressista conclamando todo o povo a pensar melhor nesta categoria muito marginalizada, para com efeito fazer todos pensarem melhor sobre esta categoria e as outras categorias que não estão lá naquele extremo da rejeição e marginalização social.

Eu que já fui chamado de estimulador jurídico por outra estudante de direito, gostei muito deste belo início de caminhada, que promete ir longe. Leia o texto naíntegra:

Encarceramento em massa após a Lei Anticrime

*Alexia de Castro 

Pouco se fala da inconstitucionalidade de alguns artigos alterados pela Lei 13.964/2019, conhecida como pacote anticrime. Dentre eles, o artigo 492, I, e. Ele fala que, para pessoas cuja condenação seja igual ou superior a 15 anos, o réu será imediatamente preso, sem que haja o devido processo legal, atingindo, portanto, o princípio da presunção de inocência. O condenado não terá sequer o direito de aguardar o trânsito do processo em liberdade.

Busca-se, com a alteração deste artigo, a punição em massa da população de baixo poder aquisitivo. O próprio STF declarou a inconstitucionalidade da execução antecipada após decisão de primeiro grau.

Muitas pessoas apoiam a prisão em segunda instância, sem que haja o trânsito em julgado. É totalmente inconstitucional, pois agride um direito fundamental, punindo ainda mais a população de baixa renda, e principalmente pessoas negras.

A população carcerária teve um aumento gradual nos últimos 20 anos. Foi cerca de 8,3% ao ano, sendo a maioria das pessoas negra ou parda (63%) e com baixo nível de escolaridade. Elas estão em vulnerabilidade social e este número reflete uma política que investe mais em presídios, do que em educação e saúde.

O Brasil mantém a quarta maior população carcerária do mundo. Fica atrás dos EUA, China e Rússia. São 748.009 pessoas presas de acordo com os dados fornecidos pelo DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, sendo 222.558 prisões provisórias.

Com base nesses números, 42% da população carcerária ainda não teve o devido julgamento. A desculpa é que a prisão corrige e restaura o indivíduo, mas a verdade é que ela é um meio de punição, reverenciado pela população, que ignora o crescimento carcerário.

A justificativa para a prisão é a regeneração do réu. Busca enquadrá-lo na sociedade como uma pessoa recuperada, mas a realidade é diferente. Quando se é preso ou está respondendo algum processo criminal, a sociedade o trata de forma indiferente. Não oferece oportunidades de trabalho, comprometendo o próprio sustento. Fazendo com que volte a cometer crimes para a sua sobrevivência.

Atualmente, a taxa de reincidência estimada é de 70% dos presidiários: a cada dez pessoas, sete voltam a cometer crimes. É certo que o problema é estrutural, onde agridem também outros direitos fundamentais além da liberdade, atingindo a dignidade da pessoa humana, passando esse constrangimento para as famílias dos réus que se submetem a tratamentos absurdos para visitar familiares nesta situação.

Não há dados comprovados de que a prisão é a solução para criar uma sociedade justa. Muito pelo contrário. Criam-se pessoas egoístas, que pouco se importam com o crescimento carcerário desde que não seja um membro da família. Contudo, sendo considerado constitucional, o art. 492, I, e do CPP contribuirá para que cresça ainda mais a população carcerária do Brasil ignorando totalmente os direitos fundamentais previstos na CF/88.

*Acadêmica de Direito

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