Para este mês, escrevi sobre a relação da advocacia e o sacerdócio:
O sacerdócio do advogado
* Wagner Dias Ferreira
A Constituição diz que o advogado é
indispensável à administração da justiça. Esta imprescindibilidade dá ao
trabalho do profissional do Direito características muito singulares. Ele
exerce atividade privada conectada de forma essencial ao Poder Judiciário.
Art. 133: o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
Com o advento da COVID 19 e a falta de alinhamento entre os entes públicos executivo, federal, estadual e municipal sobre como enfrentar a pandemia, tornou-se fundamental para o advogado estar atento às orientações dos tribunais, para realizar suas atividades.
Inicialmente, ocorreu uma suspensão geral dos trâmites processuais físicos e eletrônicos. Logo a seguir foram liberados os trâmites em processos eletrônicos. Agora, como a contaminação pela doença não sede abre-se a possibilidade para a digitalização de processos físicos de modo a permitir que estes voltem a tramitar.
E ainda passou-se a realizar audiências por videoconferência, inicialmente as conciliações, depois inclusive as instruções e julgamentos, sempre garantindo o distanciamento social. O que foi possível porque no âmbito do judiciário o CNJ vem garantindo uma coordenação bem clara de como a justiça deve funcionar no período de isolamento social, tão necessário para minimizar o contágio e permitir que o sistema de saúde tenha condições de atender aos doentes que vão aparecendo e necessitando de internação.
A característica mista do trabalho do advogado, privado e público, porque indispensável a administração da justiça, dá ao jurista advogado uma perspectiva impar do tecido social.
O advogado está em contato com o cliente no ambiente privado, protegido pela inviolabilidade de seus atos e o Supremo Tribunal Federal já reconheceu o espaço do escritório como inviolável por ser corolário da inviolabilidade profissional pessoal do advogado (ADIN 1127, pub. 11/06/2010). Condição muito peculiar que coloca o profissional em uma condição muito singular para conhecer e examinar a sociedade, de forma pragmática e ágil para sempre vislumbrar solução a multiplicidade de conflitos que emergem e dão movimento ao tecido social.
Esta singularidade no exercício da
profissão de advogado, contato privado com as pessoas naturais e jurídicas que
compõem o tecido social, e uma atuação perante o Estado que tem caráter de imprescindibilidade
permite ver as dinâmicas da sociedade com um prisma muito peculiar.
Quando Deus chamou Moisés de uma sarça ardente para atribuir a ele uma missão libertadora, o homem santo manifestou sua dificuldade para falar, no que foi acudido pela Divindade com a indicação de um Sacerdote, que seria um mediador, de certo modo, a voz de Moisés.
A dinâmica de entrevistar os clientes para apurar seus interesses ante os conflitos que descrevem ao advogado, procurar o mecanismo de submissão desta realidade trazida ao seu conhecimento as normas vigentes, sempre procurando, na medida do possível antever os passos processuais que serão trilhados é um trabalho profissional que assume sempre ares de ministério, quase sacerdotal. Os juristas mediando os homens e a justiça, os sacerdotes mediando os homens e a divindade.
Advogado especialista em Direito Criminal e do Trabalho
Veja onde o texto já foi publicado:
Portal Factótum Cultural:
https://factotumcultural.com.br/2020/07/30/o-sacerdocio-do-advogado/
Dom Total:
https://domtotal.com/artigo/8975/2020/08/o-sacerdocio-do-advogado/