Direitos indisponíveis e voto
obrigatório
*Wagner Dias Ferreira
Ao iniciar o exercício profissional,
todo advogado, por mais impetuoso que seja, encontra pelo caminho medos e
dúvidas. Porém, ele segue com “ensaio e erro” fazendo um aprendizado que consolida
conhecimentos e capacidade profissional com o tempo. Não que o decurso de prazo
afaste por completo os erros. Ele os diminui melhorando o desempenho.
Certa vez me lembro de participar de
uma audiência trabalhista onde, fazendo uma prévia com o advogado da parte
contrária, o reclamante e o preposto representante da reclamada acompanharam
tudo e chegamos a um acordo. Não era bom, mas considerando a situação
financeira da empresa, que já encontrava dificuldade de pagar outros processos,
atenderia a situação.
Animados, todos adentraram a sala de
audiências e felizes informaram à juíza que já tinham um acordo que atendia a
ambas as partes. Ao ouvir os termos, a juíza declarou que não poderia homologar
o acordo pois nele o reclamante estaria abrindo mão de verbas trabalhistas que
constituem direitos indisponíveis.
O acordo não foi homologado, veio a
sentença condenatória, impondo à empresa o pagamento de valor cerca de 100%
maior para o reclamante, no entanto, a execução foi frustrada. Deixando o cliente
de receber suas verbas ante a insolvência da empresa.
Ao assistir pela TV as insistentes
transmissões, resumos e reportagens sobre o interrogatório da presidente Dilma,
em seu processo de impeachment, nestes últimos dias a lembrança deste caso
trabalhista se tornou viva em minha mente. Sendo o famoso ganhar mas não levar.
Estava ali na experiência
profissional prática uma situação em que, ao argumento de garantia dos direitos
indisponíveis, os mesmos foram integralmente subtraídos, já que nem o mínimo
pretendido no acordo pôde ser realizado.
No processo político brasileiro algo
semelhante está a ocorrer. A Constituição Federal em seu artigo 14 declara que
“a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e
secreto”. Conforme o procedimento que elege o presidente da república.
Esta mesma Constituição declara, no
parágrafo primeiro do art. 14 que “o alistamento eleitoral e o voto são
obrigatórios para os maiores de 18 anos”. Desta forma o voto é direito
indisponível, sendo o cidadão punido se abrir mão desse direito. Assim como
aquele cliente que, em audiência judicial, não pode abrir mão de direitos trabalhistas, por meio de
acordo. Havia ali uma voz substituindo sua vontade soberana, em nome de
direitos declarados indisponíveis na lei.
No entanto, ao observar o processo
político eleitoral percebe-se que o comparecimento às eleições não garante que
seu resultado será cumprido. Assim como a postura da juíza não garantiu ao
cliente o recebimento efetivo de seus direitos. Aquele que foi eleito
diretamente pelo voto indisponível encontra uma palavra limitadora nos
parlamentares. Ensejando um travamento que impede que o eleitor receba aquilo
que pretendia quando votou.
Assim como aquela empresa era
insolvente e não garantiu ao cliente os seus direitos que já estavam na lei e
foram declarados em sentença condenatória, o Estado Brasil está insolvente
encontrando dificuldades para entregar os direitos indisponíveis do cidadão em
decorrência do modo de funcionamento dos entes que o compõem.
Não importa se houve ou deixou de
haver crime de responsabilidade. Importa que o voto obrigatório e direito
indisponível não é mais soberano.
Esta constatação é grave
principalmente porque já ocorreu um processo de impeachment no Brasil, e outros
tantos pedidos que o Congresso não deixou seguir adiante, constituindo tais
realidades verdadeira experiência do “ensaio e erro”, demonstrando afinal que
não houve consolidação de um aprendizado que permita diminuir os erros, ao
contrário eles aumentam.
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